Diagnóstico tardio agrava casos de hidradenite no país
A hidradenite supurativa (HS) é uma doença inflamatória rara e crônica que afeta os folículos pilosos em áreas como axilas, virilha e região inframamária. Trata-se de uma condição pouco conhecida no Brasil, o que contribui para o diagnóstico tardio e a piora de casos em todo o país.
Estima-se que cerca de 0,4% da população brasileira, aproximadamente 850 mil pessoas, viva com a doença, segundo dados da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). Contudo, apesar de sua prevalência, a falta de conhecimento sobre a HS, tanto por parte dos pacientes quanto de profissionais de saúde, leva a um atraso médio de 12 anos para o diagnóstico correto, período em que os pacientes consultam, em média, 14 médicos, conforme relata o dermatologista Wagner Galvão, especialista no tratamento da hidradenite supurativa no Brasil.
Hidradenite supurativa: sintomas
A hidradenite supurativa se manifesta por lesões inflamatórias dolorosas, como nódulos, abscessos, túneis e cicatrizes, que frequentemente aparecem em áreas de atrito, como axilas, virilha, glúteos e região genital. Essas lesões, que podem liberar pus, impactam significativamente a qualidade de vida dos pacientes, causando dor física e prejuízos emocionais.
A doença não é contagiosa, nem está relacionada à falta de higiene, mas suas causas complexas e multifatoriais contribuem para sua cronicidade e recorrência. A HS está associada a fatores como predisposição genética, desequilíbrios hormonais, inflamação excessiva no organismo, além de condições como obesidade, tabagismo, diabetes, hipertensão e colesterol alterado, que podem contribuir para o surgimento e piora clínica dos sintomas.
Diagnóstico: um desafio clínico
Na literatura médica, há suspeita de que até mesmo o filósofo Karl Marx tenha convivido com a condição, o que ilustra que a HS não é uma doença recente, mas ainda carece de maior atenção no Brasil. "Muitos casos de hidradenite são confundidos com foliculite, furúnculo ou até acne mais severa", explica o dermatologista Wagner Galvão. "Como o diagnóstico depende basicamente da avaliação clínica, sem um exame específico que o comprove, é comum que o paciente passe por vários profissionais até que a doença seja identificada, o que, infelizmente, pode levar anos".
O diagnóstico da hidradenite é baseado em três critérios principais: a presença de lesões típicas (nódulos inflamatórios, abscessos, fístulas ou cicatrizes), localização em áreas específicas (axilas, virilha, região inframamária, perianal ou glútea) e um curso crônico ou recorrente, com pelo menos dois episódios em seis meses ou lesões persistentes por mais de três meses.
Fatores de risco e complicações
A doença é mais comum em mulheres, especialmente após a puberdade, devido a fatores hormonais. De maneira geral, a hidradenite supurativa começa, tipicamente, na puberdade ou na fase pré-púbere, por volta dos dez aos 14 anos, podendo surgir mais tarde. Além disso, é menos comum na fase infantil, quando pode ser associada a síndromes de algumas doenças autoinflamatórias.
Em alguns casos, a HS também pode estar associada a condições como doença inflamatória intestinal e problemas articulares. O impacto psicológico é outro aspecto da doença, com altas taxas de depressão e ideação suicida entre os pacientes.
Tratamento: avanços e limitações
O tratamento da hidradenite supurativa varia conforme a gravidade. Em casos leves (estágio I), pomadas com antibióticos podem ser eficazes. Nos casos moderados (estágio II), antibióticos orais são frequentemente prescritos. Para casos graves (estágio III), medicamentos imunobiológicos são uma alternativa aos pacientes.
Um deles é o adalimumabe, o único medicamento da classe dos biológicos previsto no Rol de Procedimentos e Eventos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) — que lista a cobertura prioritária dos planos de saúde — e no Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas (PCDT) do Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento da hidradenite supurativa.
"O arsenal terapêutico ainda é limitado e, muitas vezes, precisamos recorrer a medicamentos originalmente aprovados para outras doenças", explica o dermatologista Wagner Galvão. "A chegada de novas opções pode ampliar o acesso ao tratamento, especialmente se houver incorporação pela ANS ou aprovação pela Conitec", destaca.
Ele acrescenta que, embora alguns tratamentos eficazes para a hidradenite supurativa possuam evidências científicas, como o bimequizumabe, o secuquinumabe e o curativo a vácuo — utilizado no tratamento pós-cirúrgico —, muitos não estão previstos nas diretrizes de cobertura dos planos de saúde ou do SUS, o que dificulta o acesso dos pacientes a essas opções.
Cobertura do tratamento pelo plano de saúde
O advogado especialista em planos de saúde, Elton Fernandes, relata que a negativa de cobertura para medicamentos imunobiológicos é comum, especialmente quando esses tratamentos não estão expressamente previstos no rol da ANS. "Desde a lei 14.454/2022, o fato de um tratamento ou medicamento não estar no rol da ANS é irrelevante para a cobertura, pois os tratamentos em acordo com a ciência devem ser cobertos. Seja curativo à vácuo ou medicamento imunobiológico, o importante é que haja indicação médica em acordo com a ciência", explica Fernandes.
O especialista em Direito à Saúde acrescenta, ainda, que a operadora de saúde deve ter um profissional capacitado para lidar com esses casos, a fim de que se evite buscar a Justiça para autorizar tratamentos. "Um profissional não credenciado pode prescrever tratamentos e indicar cirurgia, mesmo não estando na rede. A operadora, contudo, não precisa pagar honorários do médico particular se ela possui na rede quem faz o atendimento. Porém, não havendo profissional qualificado na rede credenciada para atendimento integral do beneficiário, é direito do usuário buscar o tratamento fora da rede credenciada, com tudo pago pelo plano", explica o advogado Elton Fernandes.
